domingo, 27 de novembro de 2011

doMINGo














Ainda é cedo. Não tão cedo, já que a legião da boa vontade não se incomodou de ligar para pedir uma doação. Clarice Lispector escrevia de manhã, penso quando desligo o telefone. Escrevia de manhã, mas vivia o resto do dia submersa em instrospectivos pensamentos que ainda nem tenho as moral, nem nunca vou ter. O telefone me desliga.

Acordo novamente, e ainda é cedo. Via mensagem, o celular me chama de puto e diz que minha amiga bebeu esta noite sozinha e escreveu uma carta. Me sinto mesmo um puto, e um puto inexpressivo. Tento lembrar a última carta que escrevi, e só o que consigo é lembrar de uma franja, de um cabelo encaracolado, e depois de um bem curto. Não curto o que sinto, mas já é tarde, porque ainda é cedo e o dia ainda é longo daqui pra frente. Bem longo.

Procurar coisas na casa do meu Irmão e do meu Pai, inclui sempre encontrar muita poeira, as velhas alergias e o olhar sanguinário do vigia no espelho. Mas as vezes gratifica e vale a pena. Como ontem, quando procurei a toalha mas achei uma caixa cheia de livros. Desde que voltei da Irlanda, ainda não encontrei nem metade dos meus livros, e, principalmente, pois não encontrei nem metade das pessoas que pegaram meus livros.

Lá, muito Jorge Amado. Uns 5. Grande Jorge Amado, como diziam lá em Portugal. No momento o Inspirador do Berro d'agua não caminha comigo. Desafinidades acontecem. Mas ainda não cheguei ao ponto de chamá-lo de Jorge Odiado. Hê. Jorge Indiferenteado, talvez. Indiferença é ruim?

Na caixa há também algum Drummond. Gosto dele. E há também o Braguinha. Ah Rubem, você sabe que eu não te procuro de verdade, nunca te procurei em livraria nenhuma, mas sempre acabamos por nos trombar. E é sempre do caralho trocar prosa contigo mano. Digo, crônicas.

Aliás, esses dias lembrei de você e do Sinezando. É que eu e o Mouro, apesar de estarmos sempre tentando abraçar a porra do mundo, ainda somos os reis do chororô, malditos cotovelos gastos, Lupcinio rodrigues e Reginaldo rossi de Barão Geraldo. E é inevitável não sintonizar as ondas de rádio com as suas e as do Sinezando.

Aê Sinezando, aquele salve em esperanto! A vida ainda é triste meu velho.

Ler Rubem Braga me faz ter vontade de conversar com meus avós. Me sinto mais a par do que aconteceu na época deles. Pra falar a verdade, eu sinto que realmente vivi na época deles. E eu devo ter vivido mesmo. Esses lances de reencarnação e pá. E eu era um cachorro. Sempre gostei de pensar que eu era um cachorro. E não é qualquer cachorro não, desses que ficam por aí latindo. Eu era o Deserto, cachorro da minha avó.

Antes de minha avó adoecer, ela me disse que queria voltar pra escola pra estudar. Semi analfabeta, ela conseguia escrever o próprio nome, e outras bem poucas coisas sabia ler. Foi se esquecendo paulatinamente do mundo, e o último nome que esquecera foi o meu. É o meu maior orgulho nesta vida. Fico pensando as vezes qual vai ser o último nome que vou me esquecer.

Ah, hoje pela tarde eu vejo o Mutarelli e o Rafa Coutinho de novo, desta vez com o Fábio Moon e o Gabriel Bá. Terminei o Daytripper dos meninos, mas depois falo melhor o que achei. O Lourenço vai estar lançando um álbum, depois de anos.

Tinha abandonado os quadrinhos faz uns 10 anos, pois além de estar descontente com um traço já formado, disse que estava incomodado em ditar todas as imagens de uma história. A literatura é um campo mais sugestivo e mais livre, da parte do leitor.

Porra, dez anos atrás eu tava assistindo pokemon.

Não tem nem o que falar. Como quadrinista, ele é de longe, tanto em forma quanto em conteúdo, meu preferido. Como escritor, tornou-se também, disparadamente, meu preferido. Pra mim, aquilo tudo é muito visceral e perigoso, ainda sendo muito sutil, uma espécie de loucura elegante, sei lá.

Só essa semana que percebi o porque de eu curtir tanto os trampos dele. Ao me mostrar possíveis maneira de se confluenciar média erudição literária e músical, literatura de rua, filosofia, humor negro e experimentalismos, ele me mostra caminhos que busco, ou que eu acho que busco.

Mas cansei de ficar puxando o saco desse careca feio. Tenta aparecer lá hoje, no centro cultural o barco. Momentos como esse não se perde. Fica ali na Teodoro e Sampaio, numa daquelas ruas que corta ela por baixo. Rá, Rua Jack Estripador.  E se me ver, me pague um café. E se tiver algum livro meu com você, devolve que agora eu tenho casa.

É porra, tenho uma casa agora. Por isso que eu to feliz. Por isso que até a velha discadora legionária da boa vontade me pareceu ser alguém legal e simpática. Claro, vocês me conhecem e sabem que vai passar. Essa velha, por exemplo, logo logo vai cair minha ficha de que ela é na verdade uma cuzona.

Bom, pelo menos vou conseguir assitir o Senhor Brasil tomando um café e comendo sucrilhos com argamassa quartzolit.





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